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Gestão de parque de máquinas

Tratores com muitas horas carregados de vitamina C

20/11/2019

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Dizem os dados do INE que em 2018 o país produziu 403 mil toneladas de laranja, valor nunca alcançado nos últimos 33 anos. E o Algarve está no topo do ranking dos maiores produtores, ficando à sua conta 70% da produção nacional, razão pela qual tem aumentado a área plantada (17 mil hectares), sendo que os concelhos de Silves e Tavira são os que mais contribuem. No entanto, a maquinaria empregue nos trabalhos, sem ser rudimentar, também não é da mais sofisticada. Ao fim e ao cabo, o fruto é colhido por mão humana.


A revista abolsamia visitou uma exploração familiar onde abundam os tratores e as alfaias, mas que aparentemente não sofrem acentuado desgaste, e onde não se vislumbra a necessidade urgente de os renovar. Assim se explica a idade avançada de algumas máquinas, para as quais a maior dificuldade de gestão é retirar-lhes o muito pó ganho no trabalho.


A Algarcitrinos aborda diariamente 42 hectares e colhe as variedades New Hall, Valência e Lane Late das árvores plantadas em terreno de fácil trato, situado logo após as arenosas campinas de Faro, e ainda antes da terra vermelha serrana, onde os Martins, Pedro e Florência, deram campo livre aos descendentes Pedro e Ângela. Ela formou-se em Agronomia na Universidade do Algarve, ele tomou o gosto pela exploração, que agora gere, e onde pesquisa e ensaia. E os resultados não são desanimadores.


“Demos-lhes sempre essa liberdade [de escolherem]”, avisa Florência. “Cresci nisto. E os meus pais sempre me deram à vontade para trabalhar aqui, no verão. Depois, quando se fez a empresa e quando me deram mais responsabilidades, decidimos que iríamos experimentar. E assim vamos tentando inovar. Há outras empresas em que os antecessores não dão espaços para os descendentes crescerem com o negócio”, reage o filho Pedro.


Teste de campo
O projeto de final de curso da irmã foi sobre os enrelvamentos. Diz Pedro que ela ensaiou se haveria diferença na produção com monda química em toda a área, ou apenas sob a árvore, sendo que entre árvores a erva seria capinada. “Notámos que não havia diferença. A verdade é que controlamos a erva com a capinadeira e só aplicamos herbicida sob a árvore. Mas deixamos o enrelvamento entre linhas, embora controlado, pois é um abrigo para bicharada benéfica ao pomar e cria uma certa biodiversidade. Num pomar novo que temos colocámos plástico que aguenta três/quatro anos na terra, e sem utilizarmos herbicida controlamos a erva durante esses anos. Onde não tem o plástico passamos com a capinadeira entre as árvores. Investimos no plástico e não na monda química”, explica Pedro.

 


Apego à marca
Naquele terreno já houve vinha, clementinas, tangerinas e alfarrobeiras, amendoeiras, plantou-se em estufa (tomate, feijão, pepino). Já as campinas de Faro estão hoje mais virados para a framboesa, conta Pedro, que onde diz sentir-se bem é a conduzir tratores. Para ele, a marca predileta é a Kubota: “Sinto-me à vontade com eles. Quando vejo as capas da revista [abolsamia, entenda-se] e observo aqueles tratores todos bonitos e limpinhos... Aqui os nossos estão sempre empoeirados. Já me têm dito: para que queres um trator com 100cv – mas nós temo-los e não acreditam que estas pequenas máquinas que temos têm essa potência. Digo sempre que nunca há demasiada cavalagem, e se trabalhamos com pulverizador, em terreno inclinado, nunca é demais, pois o motor trabalha mais folgado.”


Mas, pondo os cavalos de lado, isso é apego à marca? Sim e não. Explicação: “Há muito que trabalhamos com a Kubota, mas também temos Fendt, de que gostamos muito. A diferença entre um e outro é que, para a mesma potência compro dois Kubota pelo preço de um Fendt, que é um bom trator, mas para o que fazemos acho que não preciso tanto. O Fendt é muito trator. Dos outros não sei, pois nunca os conduzi.”
Mas quando pensam em substituição fazem-no pela idade [o parque tem, em média, 15 anos], pelo número de horas? “Revemo-nos em outros agricultores, e tudo depende do uso que lhes damos. Se tivesse um operador só para estas máquinas elas trabalhariam o dia inteiro e já estariam pagas. A verdade é que também estamos sobredimensionados para a nossa área de trabalho. E depois fazemos sempre trabalhos diferentes. Assim que apanhamos a fruta fazemos a pré-poda, um dia depois passamos o corta-mato, e se precisarmos de fazer uma aplicação é mais um dia. Daí termos sempre uma máquina disponível para o serviço, com a respetiva alfaia. O trator mais antigo tem 4000h. Quando tínhamos menos máquinas rodavam mais. Agora está mais dividido. Mas tão cedo não conto adquirir outro trator”, assume Pedro Martins.


Para cada alfaia o seu trator
Este diz não dar demasiada importância ao assunto - “desde que não avariem...” -, mas é ele próprio quem faz a manutenção básica. Verifica e muda o óleo, limpa filtros e dá massa. De vez em quando recebe no terreno a assistência das marcas.
Os tratores, claro está, são especializados, todos cabinados, e as alfaias mais necessárias são o corta-mato e o destroçador, o pulverizador e os discos de pré-poda. Uma para cada trator...
O que a família Martins não descura é a atualização técnica para os trabalhos e cuidados do pomar. Os pais visitam os salões internacionais e seguem as instruções dos filhos. “Vou avaliando pelos problemas que vamos tendo e procuro informações”, conta Pedro, como foi o caso da recortadora de poda baixa para o olival, que adaptou para o pomar. “Também vou aos salões, que é muito importante. Aqui, sentimo-nos mesmo na periferia. Tenho bicos para herbicida que mandei vir do Reino Unido, e não só ma saíram mais baratos, como há sempre disponibilidade do produto. Aqui é difícil haver coisas em stock. A citricultura no Algarve é muito pouco mecanizada.”
 


Florência gosta de pôr a árvore de mini-saia
“Gosto particularmente de andar no Fendt que tem aquele brinquedo à frente, para pôr a árvore de mini-saia”, graceja Florência. Explica o filho que se trata da recortadora de poda baixa, uma prática chamada skirting [que em tradução literal significa rodapé]: “É algo que poucos fazem nos citrinos. Fazemos pré-poda e reparámos que os pomares antigos, ao cortar por cima reagiam com mais rama por baixo. Isso criava-nos problemas com a aplicação de algum herbicida, ou para verificar a manga da rega. Fizemos, então, uma mini-saia, como no olival, para não ter rama encostada ao chão, até porque a erva trepadeira quando encontra rama já não pára. E depois facilita o arejamento na parte interior e inferior da copa da árvore. Resultado: problemas com míldio têm sido mínimos e evitamos os tratamentos com cobre. Temos vindo a adaptar o pomar de forma a minimizar a aplicação de produtos e a facilitar a colheita. Então fomos buscar esta alfaia específica. Na Austrália, quem produz para exportação é obrigado a usar essa técnica, devido a doenças. Há insetos que trepam pela árvore, pelo que a rama tem que estar a uma altura mínima.”


Mas aumentará a produção? “Ainda não deu para perceber, e se há blocos onde tiramos 20 toneladas/ha, outros há onde tiramos 60. Está estimado que a produção de citrinos no Algarve é de 25 ton/ha. Este ano, o preço médio oferecido tem sido de 20 cêntimos/quilo, mas um bom preço seria 40 cêntimos. Em 2018 chegou a sair a 45/50 cêntimos. Mas já esteve a 20 cêntimos, e outros em que a fruta ficava na árvore, pois os custos da operação ultrapassariam o preço de venda. Mas o que funciona num pomar, não quer dizer que funcione no pomar do vizinho”, rematou Pedro Martins.

 

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